O 2º semestre de vida e o 1º semestre de volta

05/05/2017

Primeiro, segundo, terceiro, quarto, quinto, sexto mês. Até aí estava tudo bem. 

Até aí, embora a maternidade tivesse as suas dificuldades, embora eu ainda estivesse tendo que aprender a lidar com a falta de sono, a entender os choros do meu filho, a ouvir conselhos e a ser paciente, estava tudo bem, porque eu estava "apenas" exercendo o meu papel de mãe, sempre ao lado do Theo e me dedicando somente a ele. Ele que, embora seja apenas um bebê que precisa de mim pra atender às suas necessidades, já naqueles dias sabia retribuir tudo com os sorrisos tão doces que aprendera dar e me ensinava todo dia um pouco mais sobre o que significa realmente o verbo amar. Juro que não rimei de propósito.

A partir do sétimo mês é que as coisas começaram a complicar de fato. Aquele bebê que no início não interagia direito, tão rápido, como se fosse de um dia para o outro, começou a demonstrar a sua personalidade. Começou a ter vontades além das necessidades físicas. Começou a querer por o dedo na tomada, tocar as coisas longe, bagunçar os armários da cozinha, abrir o lixo do banheiro, gritar cada vez mais alto simplesmente por gritar. Começou a procurar a sua independência, apesar de ainda ser tão dependente de mim.

E, em meio a essas mudanças turbulentas, em que nós começamos a entender que ter filho não é apenas cuidar, mas educar também, no nono mês eis que surgiram mais mudanças - dessa vez na minha vida particular: a famigerada volta às aulas presenciais da faculdade. Três noites por semana longe do meu filho. Uma cadeira à distância que quase esqueci que existia de tão atucanada que fiquei. Em casa, textos pra ler e trabalhos pra escrever, ao mesmo tempo em que um bebê engatinhador e que anda se apoiando ficava me chamando para brincar. Fraldas pra trocar, comidinhas pra fazer, banhos pra dar, roupas pra lavar e passar, resfriados pra tratar, disposição pra amamentar. Leituras, leituras, leituras. Ônibus atrasado. Resenhas, fichamentos, relatórios de observação de estágio - a observação em si! -, provas, apresentações em grupo. Muito estresse. Dentinhos do Theo nascendo e doendo. Minha saúde debilitada. Toda semana eu tinha um problema físico, um sintoma de sei lá eu o quê. E quando não tinha, algo surgia. 

Quanto mais sintomas apareciam, mais estressada eu ficava; quanto mais estressada eu ficava, mais sintomas apareciam. Era a tal da somatização. Tive que conversar comigo mesma para me ensinar a não me render a isso. A não me entregar às emoções. Não desistir.

Tive que perder mais uma carteira, pela terceira vez, e depois de cancelar meus cartões tive de reecontrá-la, para aprender mais um pouco sobre ter fé e não me deixar levar pela ansiedade.

Tive que chegar em casa e me deparar com o sorriso lindo do meu filho ao me ver ou a sua tranquiladade durante a soneca, pra lembrar o porquê tenho feito tudo que tenho feito.

Tive que voltar pra universidade, pra ter certeza de que mais mais díficil do qualquer curso lá lecionado, é essa tal de maternidade. Ok, essa rima talvez tenha sido intencional.

Nessa "profissão", quando a gente pensa que aprendeu tudo, algo novo aparece.

E quando esse algo novo aparece, é preciso de muita paciência, dedicação, apoio e amor.

Senão a gente enlouquece. Mas essa rima aqui não foi.

No final da primeira etapa do meu semestre de retorno, ao me deparar com notas boas, um filho saudável, uma família que me ajuda, o pai do meu filho que me anima e um Deus que jamais cessa de me amparar, sigo dia após dia, cansada, faminta, por vezes desanimada, mas grata pelas duas posições que atualmente exerço - e mais grata ainda porque embora uma delas seja temporária, a outra, a maior, é eterna.

Hoje, estudante universitária e mãe. Daqui a alguns anos, alguma-profissão-relacionada-às-Letras-que-ainda-não-decidi e mãe. Mais e mais anos depois, seja-lá-o-que-for-que-eu-estarei-fazendo e mãe. Velhinha, com rugas, calçando um all star surrado como de costume e mãe. Pra sempre: mãe. 

Por isso todo dia ao olhar para o meu filhote, tão inocente quanto esperto, procuro me lembrar de me dedicar a essa função mais do que a qualquer outra. 

Não tem diploma, nem salário. Não tem horário pra acabar. Não tem promoção, nem recompensa, às vezes nem mesmo reconhecimento pelo trabalho bem feito. 

Mas sei que é de longe o cargo mais importante que vou exercer.

E isso é o que vale, afinal, não é?

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